domingo, 2 de agosto de 2015

A malandragem que campeia à solta


Quando entrei no banco para fazer um depósito em pagamento a um serviço, ele estava na porta. Quando saí, ele continuava lá, apoiado sobre as muletas com seu ar desconsolado. Percebi que as pessoas passavam por ele indiferentes ou lançavam-lhe um olhar de enfado. Pensei comigo que aquele homem velho deveria estar em sua casa amparado pela previdência e não ali, na porta do banco, mendigando. Cheguei perto dele e perguntei de sua aposentadoria e ele me respondeu que estava aguardando a liberação. Estendi-lhe um trocado e segui em frente.
Cerca de 10 minutos depois, na porta dos Correios, uma mulher pedia dinheiro, não com a boca, com os dedos apontados, enquanto emitia um som estranho, como quem não consegue falar.
E logo, uma outra situação: sentado numa cadeira alta sobre o canteiro da praça, o malandro chamava a atenção das pessoas, com seu discurso: “ei, meu rei, ei minha rainha! Paga um café aí, dá um troco aí!”. – Cínica essa majestade, pensei.
Não precisei de mais do que meia hora e nem de andar dois quarteirões para ver essas cenas e, de volta para pegar o carro, comentei o fato com o dono do estacionamento, que riu, e me perguntou:
– E a mulher das receitas, que pede dinheiro pra comprar remédio, não encontrou com ela, não? E nem com a moça bem vestida que perdeu a bolsa e não tem como voltar pra casa?
E, então, eu entendi a indiferença das pessoas com o velho do banco, que é, na verdade, como os demais, um velho conhecido da gente que circula todos os dias por ali.
A propósito, ele é perfeitamente normal e a muleta é só um enfeite. Um enfeite que enfeita a cena e funciona, pelo menos para os que passam por ali a primeira vez.


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