Tinha um tempo em que dar presente era um ato de
amor. Eu me lembro quanto ficávamos emocionados em entregar o presente do Dia
dos Pais, um modesto par de meias ou uma caixinha de lenço; e do Dia das Mães,
um sabonete ou uma colônia. Depois veio a época de aproveitar essas datas para
comprar algo que fosse necessário para o lar. Foi quando minha mãe equipou a
cozinha com aparelhos eletrodomésticos. Até a compra da geladeira nova, do
fogão, do sofá, coincidia com o Dia das Mães ou com o aniversário delas. Até
elas encherem o saco e começarem a exigir umas coisinhas mais para uso pessoal.
No Natal, as crianças cujos pais podiam comprar,
recebiam um presentinho, uma boneca, um carrinho, uma bola. E com um brinde
agregado: a fantasia de que por trás do presente tinha a bondade de um velhinho
conhecido como Papai Noel.
Hoje, dar presente virou obrigação!
O comércio faz um marketing tão pesado sobre as datas
comemorativas que ou você compra o presente, ou sua consciência fica doendo
pelo resto do ano. São doses cavalares de apelo à sensibilidade do consumidor.
Os dias de dar presente também se multiplicaram: Natal,
Páscoa, Dia das Mães, Dia dos Pais, Dia dos Namorados, Dia das Crianças, Dia da
Secretária, Dia da Mulher, Dia da Avó, Dia da Amizade. Aposto que você nem
sabia que já tem o Dia da Sogra, 28 de abril, e o Dia do Sexo, 6 de setembro!
Resumindo, o comércio obedece a esta máxima: há sempre uma festa no meio do
caminho, e, com ela, a oportunidade de vender um presentinho.
Só para reforçar a prevalência dos interesses
comerciais em torno das datas comemorativas, vou contar uma historinha: em
grande parte do mundo, o Dia dos Namorados é comemorado em 14 de fevereiro
(Valentine’s Day), dia de São Valentin, um santo devotado às causas do amor. No
Brasil, a partir de uma campanha para esquentar as vendas de junho, então um
mês fraco para o comércio, ficou convencionada a data de 12 de junho, véspera
do dia de Santo Antonio, o popular santo casamenteiro, para homenagear os
namorados.
Eu adoro dar presente! E principalmente quando tenho
oportunidade de surpreender ou satisfazer um capricho. É muito gratificante!
Porém, tenho observado que essa obrigatoriedade está
deixando de ser um ato de amor: “Droga, ainda falta comprar o presente da
Gisele!”; “O que vou comprar para o Gabriel, aquele gordo sem noção?”; “Essa
Rita é uma chata, mas se eu não comprar nada todo mundo vai falar”; “Que azar,
tirei o Jonas no Amigo Oculto e eu nem gosto desse cara!”. E mesmo resmungando
as pessoas vão esvaziando as prateleiras das lojas, ora pagando, ora empurrando
as contas para depois do carnaval, para depois do Natal, para o ano que vem, enfim.
E satisfazendo a fome voraz do consumismo desenfreado!