segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Ouro de tolo


Tinha um tempo em que dar presente era um ato de amor. Eu me lembro quanto ficávamos emocionados em entregar o presente do Dia dos Pais, um modesto par de meias ou uma caixinha de lenço; e do Dia das Mães, um sabonete ou uma colônia. Depois veio a época de aproveitar essas datas para comprar algo que fosse necessário para o lar. Foi quando minha mãe equipou a cozinha com aparelhos eletrodomésticos. Até a compra da geladeira nova, do fogão, do sofá, coincidia com o Dia das Mães ou com o aniversário delas. Até elas encherem o saco e começarem a exigir umas coisinhas mais para uso pessoal.
No Natal, as crianças cujos pais podiam comprar, recebiam um presentinho, uma boneca, um carrinho, uma bola. E com um brinde agregado: a fantasia de que por trás do presente tinha a bondade de um velhinho conhecido como Papai Noel.
Hoje, dar presente virou obrigação!
O comércio faz um marketing tão pesado sobre as datas comemorativas que ou você compra o presente, ou sua consciência fica doendo pelo resto do ano. São doses cavalares de apelo à sensibilidade do consumidor.
Os dias de dar presente também se multiplicaram: Natal, Páscoa, Dia das Mães, Dia dos Pais, Dia dos Namorados, Dia das Crianças, Dia da Secretária, Dia da Mulher, Dia da Avó, Dia da Amizade. Aposto que você nem sabia que já tem o Dia da Sogra, 28 de abril, e o Dia do Sexo, 6 de setembro! Resumindo, o comércio obedece a esta máxima: há sempre uma festa no meio do caminho, e, com ela, a oportunidade de vender um presentinho.
Só para reforçar a prevalência dos interesses comerciais em torno das datas comemorativas, vou contar uma historinha: em grande parte do mundo, o Dia dos Namorados é comemorado em 14 de fevereiro (Valentine’s Day), dia de São Valentin, um santo devotado às causas do amor. No Brasil, a partir de uma campanha para esquentar as vendas de junho, então um mês fraco para o comércio, ficou convencionada a data de 12 de junho, véspera do dia de Santo Antonio, o popular santo casamenteiro, para homenagear os namorados.   
Eu adoro dar presente! E principalmente quando tenho oportunidade de surpreender ou satisfazer um capricho. É muito gratificante!
Porém, tenho observado que essa obrigatoriedade está deixando de ser um ato de amor: “Droga, ainda falta comprar o presente da Gisele!”; “O que vou comprar para o Gabriel, aquele gordo sem noção?”; “Essa Rita é uma chata, mas se eu não comprar nada todo mundo vai falar”; “Que azar, tirei o Jonas no Amigo Oculto e eu nem gosto desse cara!”. E mesmo resmungando as pessoas vão esvaziando as prateleiras das lojas, ora pagando, ora empurrando as contas para depois do carnaval, para depois do Natal, para o ano que vem, enfim. E satisfazendo a fome voraz do consumismo desenfreado!


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